Roberta Sá

Location:
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, BR
Type:
Artist / Band / Musician
Genre:
Samba / Tropical / Pop
Site(s):
Label:
MP,B/UNIVERSAL
Type:
Indie
Novos cânones por Roberta Sá



Mas neste seu segundo CD, Que belo estranho dia pra se ter alegria, Roberta tem também, e nitidamente, outra intenção: a de mostrar que a sua (nossa) tão amada canção brasileira continua viva, atual, interessante. Roberta parece querer dar a sua visão do que seria o contemporâneo na música popular brasileira. Ambição que, evidentemente, vem espalhada nas canções, sem comprometer a fluidez desinteressada delas.



Em abril e maio último, Roberta Sá (com seu marido, o cantor e compositor Pedro Luís) estava em meio a uma mini, mas deliciosa temporada do espetáculo “Alô. alô? 100 anos de Carmen Miranda”, com dois shows por dia nos CCBBs de Rio, São Paulo, Brasília e Belo Horizonte. Em cada apresentação, sua entrega ao repertório de Carmen era total. Não houve show em que não eletrizasse a platéia com interpretações bem pessoais de “Taí”, “Disseram que voltei americanizada” e “Na batucada da vida” – e a própria Roberta parecia tocada por aqueles sambas, que encerravam passagens tão emocionantes da vida de Carmen.



Devo saber do que estou falando porque, em todos os shows, eu estava no palco, sentado a uma mesa, a menos de dois metros de Roberta, pontuando os números musicais com comentários sobre Carmen. E era flagrante a identificação dessa cantora tão jovem com aquele outra, nascida há 100 anos, e cuja lenda era até maior que a vida de todos nós ali – Roberta se movia pelo repertório de Carmen como se fosse o seu próprio, com um à-vontade que me convenceu de que, enquanto produzir intérpretes como ela, a música popular tem o seu futuro assegurado.



Mais surpreso fiquei há pouco ao constatar que, nos intervalos entre as viagens aos CCBBs, Roberta estava ensaiando e dando os toques finais nos números do DVD de seu disco Que belo estranho dia pra se ter alegria, finalmente gravado no Vivo Rio para uma apaixonada platéia. Não podiam ser propostas mais diferentes e, no entanto, a cantora era a mesma – sedutora, altamente técnica, com domínio absoluto.



Nos shows do CCBB, ela estava lidando com cânones quase sagrados da música brasileira: os sambas e marchinhas dos compositores imortalizados por Carmen Miranda. No Vivo Rio, ela estava estabelecendo os seus próprios cânones – escrevendo a história com a sua própria tinta.



Não importava que algumas daquelas canções, como “Alô, fevereiro”, de Sidney Miller, “Interessa?”, de Carvalhinho, ou “A vizinha do lado”, de Dorival Caymmi, já tivessem sido gravadas no passado – era como se tivessem esperando pela gravação de Roberta para se considerarem definitivas. Para contrabalançá-las, havia as canções dos jovens compositores que têm sido os seus companheiros de viagem: Lula Queiroga (“Belo estranho dia de amanhã” e “Ah, se eu vou”), Moreno Veloso e Quito Ribeiro (“Mais alguém”), Edu Krieger (“Novo amor”), Roque Ferreira (“Laranjeira”), Luís Machado (“Samba do balanço”) e Rodrigo Maranhão (“Samba de um minuto”). Nenhum deles tão próximo, naturalmente, quanto Pedro Luís, autor de alguns dos melhores momentos do DVD, como o flamejante “Fogo e gasolina” (com Carlos Rennó) e a bonita “Janeiros” (com – adivinhe! – a própria Roberta). É material de primeira com que assentar novas bases para a canção popular.



Roberta Sá transita sem o menor temor entre o material já consagrado pelos grandes nomes e o que cabe só a ela consagrar. E por que consegue isto? Porque, em tempo recorde, cristalizou um estilo a que qualquer canção, por mais nobre ou vadia, se amolda – venha esta de Chico Buarque, Cartola ou Janet de Almeida, ou dos novos talentos que parecem se realizar ao escrever para ela. Cantora canônica é isso aí.



P.S.: Entre os extras do DVD, a prova do compromisso de Roberta Sá com a qualidade: as participações de Chico Buarque e do violonista Marcello Gonçalves em “Mambembe”, do próprio Chico Buarque; de Ney Matogrosso e do Trio Madeira Brasil em “Peito vazio”, de Cartola e Elton Medeiros; e de Yamandú Costa, Antônio Zambujo e Ricardo Cruz em “Eu já não sei”, de Domingos Gonçalves e Carlos Gonçalves.



O prazer de Roberta em se apresentar com essa turma é quase imoral, de tão evidente – prazer que é nitidamente retribuído por eles, porque os muito musicais se reconhecem quando se encontram.



Prazer menor apenas do que o nosso ao ouvi-los.



por Ruy Castro, ago/2009.
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